27.2.07




BRINDE


Às Vezes

Às vezes julgo ver nos meus olhos
A promessa de outros seres
Que eu podia ter sido,
Se a vida tivesse sido outra.

Mas dessa fabulosa descoberta
Só me vem o terror e a mágoa
De me sentir sem forma, vaga e incerta
Como a água.

(Sophia de Mello Breyner Andresen, Obra Poética I)





FAVA


Tríptico Nómada

I – Nova Iorque, Um

1
outras manhãs
molha o papel na cinza dizendo: «os meus,
ninguém que adivinhasse a mesa rasgada, as meias
balões verdes de areia pesando ao contrário dos olhos ao
pénis, demasia fácil.

2
descruzando o mostrador, para passar
o lápis partido a meio da boca
«seios, igualmente desertos
na quadragésima segunda rua
anos: ardendo
as botas, de cavalaria

3
não tocamos na vaca
lenço preso à narina mais branca
o cuspo manchou todas as vitrinas
sentando-se, que o sangue apodrece
o arame dos testículos
apareceu por acidente adormecido
na janela com chuva

4
ou que não gira, mas
uma palpitação colada aos seios da cama
o polícia negro maneja a ventoinha sobre
retratos, uma moldura mostrando
a lápis, assinado rembrandt.

5
alimentando-se, outras
de aço fundido atrás dos anjos
desabotoando as rosas no urinol azul
helicóptero justamente às 5 e trinta apertando
a narina mais larga contra o peito
dos arranha-céus
«a boca,
urna pedra acaba de cair muito mais tarde.

6
por lentidão ou por ser
o olho da vaca acende e apaga lápis
aparados no televisor uniformernente liso

o perfeito animal
entre as coxas do peixe suor branco
alheio à solidão.

7
por times square o tempo de virar
uma narina ao lado do silêncio
alisando as verrugas molha na cinza
o pénis da hora
na vitrina inconsolável presidente violeta
«são sensíveis,
animal perfeito, ninguém que descubra
o enxame inclinado nas axilas

8
a boca abre-se em duas cores com
plementares acrílicas ligeiramente so
brepostas;
a chávena na ponta do braço direito a
vança hesitando e o líq
uido quente enfia no buraco da carne
uma lufada de casas intermitentes
«pequeno almoço em tiffany’s».

9
apenas o ar, dedos
enfiados no anel manejando o arame visível, até
as fezes do néon finalmente dissolvem
penumbra, o cacho «meramente,
aperta nos lábios uma saliva incómoda

10
espalhando o alcatrão por sobre a zona
entre as nádegas o cuspo mais facilmente seca
a viúva que o gelo conservou sem perca
«ao frio,
outras
agarrando nos dentes a pedra portátil
espera que o mundo caminhe ao contrário
em direcção ao esperma deixado
vagina sem mãe.

(António Franco Alexandre, Poemas)

5 comentários:

Susana Alves disse...

Manel, não me venhas, por favor, dizer que esta fava é bonita, que é poesia, etc... lol.

sea disse...

Sou água... às vezes.
Beijos aqui ou na lua

Ricardo disse...

Que nojo!
Mas é a prova de que a literatura tem consequências no foro fisiológico: vou ali vomitar e já venho!

Selene disse...

Que fava horrorosamente grande e feia! Realmente a literatura portuguesa tem poesia que não é digna desse nome!

Manuel disse...

Olá a todos.

hmm... é assim: a prova que é poesia "da boa" é que vos causa uma sensação intensa, e quase que aposto que a intenção do poeta era justamente a de chocar os leitores mais "sensíveis". Voces provam que ele o conseguiu. A má poesia, na minha modesta opinião é aquela que depois de se ler não levanta um único pensamento, não nos dá nada, nenhum sentimento ou sensação. O António Franco Alexandre causa vómitos ao ricardo, mas acreditem que o pior é não causar nada...Isso é que é má poesia, aquela que lêmos e não deixa rasto..

Bjs e abraços